quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Romance Teatral


Um dos atributos habitualmente reconhecidos na literatura russa é a análise psicológica e uma certa ambiência psíquica que afasta os russos dos demais europeus. Na obra "Romance Teatral", de Mikhail Bulgakov, a dimensão psicológica é intensa pela incerteza e pela teia labiríntica em torno de Serguei Leontievich, personagem principal candidata a dramaturgo.
De certa forma, podemos ver neste livro uma matriz kafkiana, uma vez que Serguei é conduzido por dezenas de escritórios e outros tantos responsáveis ou influentes pessoas do teatro. Na verdade, o caminho para ver uma peça sua representada é um calvário agónico, sobretudo depois do processo para alguém ter reconhecido o seu valor ter sido igualmente demorado. Um sem fim de portas abertas/fechadas e entrevistas deixam Serguei numa confusão que praticamente o deixa na prateleira dos desistentes.
O absurdo (mais uma vez a presença curiosa de Kafka) da situação é inverosímil, pois os actores, secretários, encenadores, amigos espectadores, diletantes decadentes do teatro russo, vêem-se no papel de editores, dada a natureza impulsiva para criticar e emendar o texto que apenas ao autor pertenceria. Ainda mais absurdo se torna quando Serguei Leontievich escreve uma peça para actores jovens, aquilo que podemos considerar jovens adultos, e no teatro apresentam-se os actores veteranos, os fundadores do Teatro Central, como os actores ideais para tal peça. Ora, a questão torna-se ainda mais absurda quando estes actores teriam perto de cem anos, sendo que alguns deles teriam trabalhado com actores do princípio do século XIX!
Nesta obra de Mikhail Bulgakov encontro uma certa crítica ao teatro russo e a todos os grupos que influenciam os seus movimentos, mas também a repúdia ao regime estalinista, o qual proibiu Bulgakov de escrever durante algum tempo.

"Romance Teatral"
Parceria António Maria Pereira, 1973

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