segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Três Contos


Escrever sobre Máximo Gorki é escrever sobre a sociedade russa; ler Máximo Gorki é saber a cultura de um povo magnífico. Nestes "Três Contos" deparamo-nos com temas muito particulares da literatura russa: a condição miserável dos operários - é um tema transversal à literatura russa e não só à literatura soviética -, onde a dureza do quotidiano marca profundamente o carácter das pessoas; as relações familiares, nomeadamente o respeito pelos mais velhos, o sacrifício praticado por estes para que aqueles não sintam a fome de todos os dias; o onírico eslavo que tem como morada as tundras e as planícies vastas do frio.

Máximo Gorki é um dos expoentes maiores da literatura comprometida, durante muito tempo o escritor "oficial" da revolução, o escritor que imortalizou Lénine e que com este trocou uma correspondência sincera e riquíssima. Naturalmente que a sua obra de maior fama é "A Mãe", romance ideológico, mas também de amor e dedicação, não mãe-filho e vice-versa, como filho-humanidade.

Embora seja um autor imediatamente conotado com a revolução e com a luta dos oprimidos, Máximo Gorki acaba por ter uma obra diversa e multifacetada, através de páginas de magnífica beleza e poesia, páginas que servem perfeitamente para caracterizar um povo tão heterogéneo. Nesta pequena obra, o autor russo escreve de uma forma avassaladora sobre as agruras de um avô e de um neto, miseráveis na condição de seres humanos, pedintes de cidade em cidade, esfomeados e desesperados num país frio e infinito. O avô tudo fará para que o neto não deixe de comer e que jamais sinta no estômago a fome que ele já testemunhou. Para que a miséria seja mitigada, por vezes, é necessário recorrer a expedientes menos próprios, consequência imediata da deplorabilidade da condição humana. É precisamente através de um expediente nada honroso que a tragédia afasta os dois, o conflito é dramático, o final inesperado. O amor jamais os separou e aquilo que está reservado a ambos é prova disso.

Por outro lado, temos uma fada que quer conhecer os homens e o mundo destes, pese embora os avisos da mãe ainda soem nos seus ouvidos. A perfídia e maldade derrotam a ingenuidade e a pureza magistral do coração da fada, esta sofre porque anseia conhecer o mundo e a vida para lá da floresta cerrada. Neste caso, temos um pastor que alicia a fada com canções cantadas por uma maravilhosa voz, mas no fundo, não passa de beleza dissimulada para capturar a verdadeira, aquela que a só a pureza pode ter.

Finalmente, o último conto deste pequeno livro, aborda a vida nas salinas, o trabalho e as relações tensas entre quem está dependente daquele trabalho para sobreviver e os que acabam de chegar. A relação de ameaça entre quem está empregado e quem procura desesperadamente agarrar-se a um trabalho desumano, um tema que podemos considerar actual e que seria precisamente algo que Gorki criticaria nos nossos dias. O espírito que perpassa em todo este conto é uma marca enraízada na cultura russa: violenta e sarcástica, mas também humana e solidária.
"Três Contos"
Editorial Inova, 1972

1 comentário:

  1. "Pintou o estado social e moral dos antigos servos e deu vida à literatura do seu país, que havia um quarto de século nada produzia de notável".

    http://www.praestudar.com.br/2012/11/maximo-gorki.html

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