segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Audiência, Vernissage e Petição


As três peças de teatro reunidas neste livro abalam-me por características importantíssimas no teatro: a tensão, a confusão psicológica que conduz ao absurdo, a manipulação mental com o propósito de conquista.
O ambiente etílico da primeira peça introduz-nos imediatamente no centro do conflito, um escritório que tresanda a cerveja e o cervejeiro que não pára de beber. Vanek, o empregado que vai falar com o responsável, é constantemente convidado a beber, afinal de contas está numa fábrica de cerveja. O empregado prefere não beber e por isso a lucidez mantém-se no seu espírito.
Uma das técnicas utilizadas por Václav Havel é a repetição, as personagens são levadas a repetir frases, por vezes até à exaustão. Será para enfatizar uma ideia? Penso que será para o espectador se centrar no perfil psicológico da personagem, quer para compreender a sua fraqueza ou objectivos obscuros, quer absurdizar a acção. De facto, o dramaturgo checo domina o ritmo das palavras e o seu uso, as repetições surgem nos momentos exactos e às tantas o próprio leitor dá por si a cantar interiormente as falas das personagens.
Para atingir a intensidade que explode nos palcos, Václav Havel opta por frases curtas e linguagem vulgar, sem que isso destrua a beleza dos seus textos, para intensificar a angústia de determinada personagem, ou por outro lado, para destacar o absurdo de tal figura. A literatura de leste desconstrói realidades adquiridas e caricaturiza aquilo que é o poder instalado, atingindo por vezes instantes de sátira à grotesca existência dos homens de estado, mas também daqueles que os temem. Exemplo disso é a peça "Petição": dois intelectuais discutem sobre companheiros presos e perseguidos, discutem a possibilidade da criação de uma petição e posterior publicação no ocidente. Na verdade, um procura que seja o outro a assinar, enquanto que este já tem o documento preparado. Encontramos aqui um jogo extraordinário de pressões e medos, onde ninguém quer entregar o coração nem perdê-lo por confiar em demasia.
Em quem confiar nas peças de Václav Havel?


"Audiência, Vernissage e Petição"
Relógio D'Água Editores, 1990

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