terça-feira, 28 de julho de 2009

A Prova


Na segunda parte da trilogia acompanhamos apenas a vida de um dos irmãos, Lucas T. O ambiente já não é de guerra, mas sim de ocupação, um governo revolucionário que controla o país e os habitantes. O outro irmão, Claus T., conseguiu passar a fronteira para encontrar um país em paz, mas dele nada sabemos ao longo do livro. A separação é necessária.
Novamente encontramos traços de humanismo em Lucas quando ele recebe em casa uma mãe e o filho, Yasmine e Mathias, um bastardo corcunda, que pese embora a sua deficiência física – ou pela existência da mesma -, consegue destacar-se dos seus colegas pela sua inteligência. A mãe não acredita nas capacidades do filho, mas Lucas não desiste e educa a criança como se fosse seu filho. Na verdade, Lucas vê em Mathias o seu irmão Claus, vê-se a si mesmo. No fundo, Mathias serve de espelho que reflecte o passado e ao mesmo tempo, é uma espécie de plataforma para o futuro, uma vez que Lucas quer mantê-lo junto de si por acreditar nas suas qualidades e por amá-lo.
Entretanto, Lucas já não é uma criança e as mulheres começam a insinuar-se na sua vida. Lamentavelmente, as relações de Lucas nunca são completas, uma vez que servem apenas para compensar perdas ou ausências, ou seja, Clara, uma mulher que lhe fornece livros incluídos no índex revolucionário, continua à espera de Thomas (seu marido) e jamais o esquecerá; Yasmine sonha com Lucas e também com o próprio pai, sendo este substituído por Lucas. Lucas opta por Clara, deixando Yasmine em casa, porém, Mathias jamais ficará para segundo plano. Aparece ainda outra jovem mulher, Agnès, cuja presença, indirectamente, conduzirá o pequeno Mathias à agonia.
Uma vez mais, como na primeira parte, somos confrontados com os vícios humanos, nomeadamente através do pai de Yasmine, o qual mantinha uma relação com a filha e que acabaria por ser pai e avô da mesma criança. De facto, Agota Kristof associa o momento guerra ou momento extremo da Humanidade a todos os caracteres hediondos do Homem. O primeiro desses caracteres será sempre o mais secreto, o mais interior em nós: o sexo. A obra é rica em personagens mais ou menos viciosas, desde um padre redimido a um pai que ama a filha fisicamente.
A guerra terminou e Lucas compra uma livraria, a mesma onde comprava com o seu irmão os cadernos para os apontamentos (o caderno grande). O anterior dono, Victor, vendeu a livraria porque queria ser escritor. Não chegou a sê-lo porque aquele momento de silêncio absoluto nunca o rodeou.
A tranquilidade parece ser uma certeza, mas mesmo no pós-guerra, a paz é uma subtileza que facilmente se desintegra. Aquilo que Lucas construíra acaba por desaparecer, tudo muda porque nada era sólido, aquilo que Lucas sabia e não revelava a ninguém era demasiado forte, por isso nunca ninguém acaba por fazer parte da vida de Lucas. Ninguém, a não ser Claus T., regressado a pequena cidade no fim do segundo livro. Entra Claus e desaparece Lucas.

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